domingo, 13 de julho de 2014

Delegacias da RMF superlotadas: 'não temos onde colocá-los', diz juíza

Vinte e nove pessoas ocupando um espaço onde só deveriam estar, no máximo, oito. A situação degradante e insalubre é a realidade vivida por detentos reclusos nas delegacias de Polícia Civil da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF). O exemplo citado se refere à Delegacia de Maracanaú. Na soma das delegacias da RMF, estão 165 presos (até a última sexta-feira), que deveriam ser transferidos para o sistema carcerário e não o foram por ausência de vagas.
Há quase um mês, nenhum preso da RMF é transferido para presídios. A situação obrigou o diretor do Departamento de Polícia Metropolitana (DPM), delegado Jairo Façanha Pequeno a enviar ofício para "sensibilizar" a juíza titular da Coordenadoria de Presídios de Fortaleza, Luciana Teixeira de Souza. "Apelei para a sensibilidade dela", disse o delegado. A juíza autorizou a transferência dos detentos reclusos nas Delegacias das cidades onde não há cadeia pública.
"As delegacias da Região Metropolitana já têm 165 presos e elas não têm condições. A Secretaria de Justiça (Sejus) não está recebendo presos. Não está havendo transferências", reclamou o delegado Jairo.
Ele afirma que há riscos tanto para os presos quanto para a sociedade, diante da situação. "Com a superlotação, há um risco permanente de fuga, de rebelião, de resgate. Além do risco de vida dos presos", frisa.
Dentre os muitos problemas que a superlotação causa instantaneamente à sociedade, citados pelo delegado, está inclusive a diminuição do número de policiais militares nas ruas. "Quando um preso adoece, um policial tem de ser disponibilizado para acompanhá-lo, e temos que apelar para a PM. Tem que tirar policial da rua para fazer escolta de preso", reclama. Dentre os reclusos, autores de crimes dos mais diversos. "Estão todos misturados. Assaltantes, traficantes. Uma boa parte, homicidas. Enviei um documento para a juíza, e estou esperando para resolver esse problema. É uma situação caótica dentro das delegacias. Tem de haver uma solução o mais breve possível antes que fique ainda pior", indicou Jairo.
Juíza busca solução
A titular da Coordenadoria de Presídios de Fortaleza, Luciana Teixeira de Souza, confirma a dificuldade de encontrar vagas no sistema carcerário para atender à demanda. "A população carcerária cresce em Progressão Geométrica e os espaços para eles aumentam em Progressão Aritmética", disse, justificando a situação.
"Estamos procurando uma maneira para equacionar o 'superinchaço' do sistema. Vamos receber os presos das comarcas onde não existe cadeia pública", informou a magistrada.
Entretanto, em alguns municípios, como Maracanaú, por exemplo, a cadeia pública também não tem condições de receber presos, segundo o delegado Jaime Façanha Pequeno. Luciana afirmou que irá analisar caso a caso para tomar as decisões. "É uma situação difícil. É necessário que se construa novas unidades carcerárias em caráter emergencial para começar a pensar em descomprimir o sistema. Temos sensibilidade quanto à situação, mas não podemos dar uma solução, pois não temos onde colocá-los", admitiu.
Para a magistrada, a situação é ainda pior ao se pensar na maneira como os detentos retornarão para a sociedade. "O sistema, assim, é difícil de se pensar em recuperar alguém. A regra é eles saírem em uma situação ainda mais violenta do que quando entraram, pela falta de estrutura. É um conjunto de situações que só gera mais violência", opinou a magistrada.
A juíza citou a construção da Casa de Privação Provisória de Liberdade (CPPL) V, que já será inaugurada com a capacidade praticamente toda preenchida. "A CPPL de Caucaia será desativada e os detentos serão transferidos para a CPPL V. Só a migração deles tomará praticamente toda a capacidade. Isso tudo é resultado do vácuo de todo esse tempo sem se construir presídios. É importante que se construa com qualidade e pensando na questão da reinserção, de dar condições de os presos saírem e não voltarem a delinquir, que é isso que a sociedade espera. Só jogá-los, como em um depósito, eles vão voltar para a sociedade e ficar nesse ciclo de entra e sai do sistema carcerário", explanou Luciana.
A transferência dos reclusos nas delegacias onde não há cadeias públicas, "solução alternativa e momentânea", segundo a juíza, deverá ser iniciada até segunda-feira (14).
Sejus aguarda ordem
Por telefone, a Sejus informou que não pode agir sem autorização da Justiça. "Precisamos de autorização judicial para fazer alguma transferência. Não temos como arbitrar nada, a decisão cabe aos juízes da comarca", explicou o órgão.
Para que as transferências ocorram, o juiz de cada comarca deve fazer a solicitação formal, e a juíza da comarca receptora,deve concordar ou não.
Em fevereiro deste ano, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) recomendou ao Governo do Estado do Ceará a construção de cinco unidades prisionais, além da criação de mais uma (a quarta) Vara das Execuções Criminais e melhoria na gestão de investimentos no Sistema Penal.
As 'sugestões' fazem parte do relatório final do Mutirão Carcerário realizado em Fortaleza no ano passado. Segundo a Sejus, há 11 unidades em fase de construção, gerando 5.290 vagas. Em sete anos, 22 unidades carcerárias já foram entregues.
Levi de Freitas
Repórter

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