O acesso à Justiça é direito fundamental do
cidadão brasileiro, como atesta a Constituição Federal em seu artigo 5º,
seja por lesão ou ameaça a qualquer direito. Porém, em todo o País, a
estrutura jurídica ainda tem deficiências que impedem o acesso da
população à resolução de problemas. No Ceará, há carência de
profissionais em diversos órgãos, mas de forma mais pronunciada na
Defensoria Pública. O desnível entre o número de defensores em relação a
promotores e juízes pode prejudicar, inclusive, o andamento de ações
judiciais.
Com população estimada de 9,1 milhões de habitantes, de acordo com o
IBGE, o Ceará tem apenas 314 defensores, presentes em 45 municípios
cearenses - o que corresponde a apenas 25% das comarcas do Estado. De
acordo com o Ministério da Justiça, a proporção ideal é de um defensor
público para até 15 mil pessoas.
Segundo a Defensoria, o efetivo do órgão era ainda menor em 2015 (313
defensores) e 2016 (310). Hoje, tem 148 cargos vagos à espera de
provimento. O último concurso público ocorreu em 2015. Como o processo é
válido até este ano, cerca de 80 pessoas aguardam nomeação.
Em contrapartida, o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (TJCE)
tem, atualmente, 428 magistrados: 385 juízes no 1º Grau e 43
desembargadores. Mesmo assim, o número de juízes ainda é insuficiente
para preencher as 398 varas e juizados do Estado. "Para aquelas que não
possuem juiz titular, o Tribunal designa juiz para atuar em
respondência, de modo que nenhuma unidade fica sem os serviços de
magistrado", garante o órgão.
O Tribunal reconhece que há 87 cargos vagos; 50 devem ser preenchidos
por concurso público de juiz substituto. Duas vagas são reservadas para
pessoas com deficiência e dez para candidatos negros. A previsão de
conclusão do certame é março deste ano.
Para dar vazão ao andamento dos processos, o novo presidente do TJCE,
desembargador Washington Araújo, revelou, em entrevista ao Sistema
Verdes Mares, que pretende contratar mais 300 servidores para auxiliar
os magistrados nos julgamentos. Destes, 200 serão estagiários de
Pós-Graduação e, outros 100, juízes leigos remunerados por ato.
O Tribunal também salientou a nova Organização Judiciária cearense
como uma das principais medidas para facilitar o acesso da população à
Justiça. A medida permitiu a criação de unidades judiciais em comarcas
"onde existe maior demanda processual".
Foram criadas 18 Varas e um Juizado Especial Cível e Criminal em 16
comarcas do Interior. Nove já foram instaladas. Ao todo, o Ceará possui
45 comarcas vinculadas a comarcas-sede: 36 à entrância inicial e nove à
intermediária. Pela Lei da Reestruturação Judiciária, o juiz responsável
pela comarca vinculada deve comparecer a ela, no mínimo, a cada 15
dias, para a realização de audiências ou outros atos necessários "para
uma célere prestação jurisdicional".
Além do Estado-Juiz, existe também o Estado-Acusador. Segundo o
portal do Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), o órgão possui
440 membros, sendo 393 promotores, que atuam nos processos de 1ª
instância e representam o contato direto do MP com a sociedade, e mais
47 procuradores de Justiça, que integram a segunda instância.
Para a defensora geral do Estado, Mariana Lobo, a discrepância no
número de profissionais desequilibra o sistema de Justiça. "Precisamos
garantir que o mesmo Estado que acusa e que julga dê a mesma paridade ao
que defende. Na prática, como ocorre nas áreas criminal e de direito da
família, muitas vezes, os processos ficam parados. Existem pessoas sem
completa assistência jurídica".
Exemplo do desamparo ocorreu ao agricultor G.M.S., 36, que permaneceu
três meses detido na Cadeia de Iguatu, pelo furto de um pacote de
biscoito, um par de chinelos e um talher da casa de uma vizinha. À
época, o defensor responsável pelo caso pediu relaxamento da prisão e
impetrou um habeas corpus, sob o princípio da insignificância.
Macrorregiões
Interior do Ceará é mais carente dos serviços judiciais. Para
facilitar o acesso, há dois anos, o Governo do Estado sancionou a
implementação de macrorregiões defensoriais. Segundo Mariana Lobo, o
defensor lotado deve se deslocar uma vez por semana para os municípios
menores. "Mesmo assim, após a aprovação, ainda não conseguimos nomear
esses defensores".
Para suprir a demanda, é preciso nomear um advogado por ato
judiciário, o que, segundo a defensora, pode tornar o processo mais
longo. "Ele recebe por ato realizado e não pelo todo do processo. Para
se ter ideia, tem atos que chegam a R$ 500 cada. Se foram realizadas
oito audiências, dá R$ 4 mil".
O TJCE explica que a designação dos advogados - defensores dativos- é
feita mediante análise da necessidade de cada caso e cabe ao juiz
competente nomeá-los para patrocinar a causa do necessitado. O órgão não
dispõe de dados relacionados à atividade.
diario do nordeste