Nos municípios com menos eleitores, o montante a ser gasto por eleitor é maior que nas grandes cidadesA
quantia que os candidatos a prefeito em grandes cidades pretendem
gastar na campanha deste ano pode ser considerada elevada. No entanto,
uma simples análise dos números revela que, nos municípios menores, o
montante a ser despendido dividido por eleitor é ainda mais expressivo.
Nas dez cidades cearenses com maior eleitorado, por exemplo, os
postulantes pretendem gastar aproximadamente R$ 140,8 milhões para
conquistar 2.543.528 votos, alcançando a marca de R$ 55,35 por eleitor.
Enquanto isso, nos dez menores municípios, a expectativa do gasto
aumenta em 72%: R$ 95,15 por eleitor. Isso porque os candidatos dessas
cidades, juntos, planejam investir R$ 5,3 milhões para conquistar 55.699
votos.
Mauro
Benevides aponta o financiamento exclusivamente público como
alternativa para evitar caixa dois para as campanhas FOTO: AGÊNCIA O
GLOBOO valor estimado para ser gasto impressiona mesmo
em cidades com eleitorado reduzido. Senador Sá, por exemplo, é o
município com menos eleitores do Ceará: ao todo, são 5.356. Apesar
disso, os três candidatos a prefeito da cidade planejam gastar, juntos,
R$ 1,15 milhão nas eleições deste ano. Isso representa um investimento
de R$ 214,44 por eleitor, quase seis vezes mais que a previsão na
Capital, que é de R$ 37 por pessoa apta a votar.
Dados divulgados
pelo Tribunal Superior Eleitoral revelam ainda que os prefeituráveis em
cada um dos dez menores colégios eleitorais do Ceará pretendem gastar
mais por eleitor do que os postulantes em Fortaleza. Analisando as
informações, fica fácil perceber a discrepância entre os valores
investidos nas campanhas eleitorais, seja em municípios com um milhão ou
com cinco mil eleitores. Isso porque o tamanho do eleitorado não parece
ser um critério significativo na hora de planejar os gastos.
EleitoradoO
município de Caucaia, por exemplo, é o segundo maior colégio eleitoral
do Estado. Lá, sete candidatos planejam aplicar o montante de R$ 37,2
milhões, o que equivale a R$ 192,90 por eleitor. Mas o custo não
necessariamente acompanha o tamanho do eleitorado. Juazeiro do Norte,
por exemplo, tem 18.144 pessoas aptas a votar a mais do que Maracanaú.
Mesmo assim, os quatro candidatos a prefeito de Maracanaú planejaram
gastar quatro vezes mais na campanha do que os três de Juazeiro. O custo
por eleitor nesses municípios corresponde, respectivamente, a R$ 152,50
e R$ 24,70.
Uma solução apontada para tentar combater as
campanhas cada vez mais caras, a falta de limite de gastos por partido
na eleição e a ligação latente entre empresários e políticos em razão de
investimentos na disputa eleitoral é o financiamento exclusivamente
público das campanhas. A proposta, discutida há anos no Congresso
Nacional mas ainda sem resolução, causa polêmica tanto no meio político
quanto na sociedade.
Atualmente, as campanhas eleitorais no
Brasil têm um sistema misto de financiamento. Ao mesmo tempo em que são
utilizados recursos públicos através do chamado Fundo Partidário, é
permitida a doação financeira por pessoas físicas ou jurídicas. No
Congresso Nacional, as discussões sobre essa questão, inclusas na
Reforma Política, é no sentido de um financiamento exclusivamente
público ou também com doações de pessoas físicas, excluindo a
possibilidade de doações de empresários.
O senador cearense
Eunício Oliveira (PMDB) acredita que o financiamento exclusivamente
público é o caminho para uma disputa mais igualitária entre os
candidatos. "Com o financiamento público, fica muito mais democrático.
Acaba com a questão da amizade com pessoas que possam financiar as
campanhas. Eu acho que o financiamento público democratiza a eleição
para quem não tem condição de disputar", afirma.
O senador
argumenta que, atualmente, o controle e a fiscalização sobre os gastos
de campanha são suficientes, mas pondera que é impossível resolver a
questão sem adotar o financiamento exclusivamente público. "A campanha
já foi muito reduzida, não há mais tantos custos, a não ser com
deslocamento e produção de televisão, que é muito caro. O resto já foi
tirado: outdoors, shows. É que é caro mesmo a pessoa em 90 dias se
tornar conhecido", justifica.
TerminativoA
Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, presidida por
Eunício Oliveira, aprovou no ano passado uma proposta de financiamento
público de campanha eleitoral, o PLS 268/11, que tramita em conjunto com
matéria semelhante apresentada em 2008. A decisão, embora tomada em
caráter terminativo, motivou um recurso para que a matéria seja
apreciada em plenário. O projeto aguarda inclusão na Ordem do Dia.
O
deputado federal cearense Mauro Benevides (PMDB) tem acompanhado o
debate sobre a questão durante vários mandatos que exerceu tanto no
Senado e quanto na Câmara. Ele afirma que os debates no Congresso têm
apontado o financiamento público de campanha como grande alternativa de
evitar as distorções de caixa dois com recursos da administração
pública. Dentre as alternativas, pontua o deputado, estão o
financiamento público com doações de pessoas físicas ou o financiamento
exclusivamente público.
"Acredito que somente após o pleito deste
ano essa matéria voltará a ser discutida na comissão especial, mas se
houver concordância, é possível que ainda nesta legislatura a gente vote
a Reforma Política", declara Benevides. A proposta que tem ganhado mais
apoio na Câmara é do financiamento exclusivamente público, com um
cálculo para repasse de R$7 por eleitor. "Mas não há nenhum critério
ainda sobre a participação no orçamento da União", atenta o deputado.
Mauro
Benevides tem defendido a tese de que, ao invés da discussão separada
sobre os itens da Reforma Política, deveria ser criada uma comissão
mista de deputados e senadores. "Seria uma única decisão congressual e
não haveria o tramite de ser decidido em uma Casa e depois ir para a
outra", afirma, o que poderia dar celeridade também à proposta sobre o
financiamento público das campanhas, o que ele acredita ser uma
alternativa para evitar o caixa dois no poder público.
No
entanto, para o cientista político Uribam Xavier, o problema das
campanhas milionárias não passa apenas pela questão do financiamento
público. "Se você não tiver uma fiscalização muito grande, não vai
resolver a questão. Minha concepção é que por trás do financiamento
público, há uma discussão maior: quem financia a campanha? Se dá por
grupos que têm interesses em algum aspecto da dinâmica do Poder",
considera.
EmpresasPara ele, o
financiamento público de campanha só é positivo se for proibida a
contribuição por empresas privadas. "Outro cuidado é que, pra ter
financiamento público de campanha, tem que se discutir os critérios para
os partidos terem financiamento, senão todo mundo forma partido pra
isso. Esse é um risco que se corre", pondera, argumentando ainda que não
se pode pensar financiamento desvinculada de uma reforma política,
senão a iniciativa se torna frágil.
Uribam Xavier acredita que a
demora para o Congresso decidir sobre o financiamento das campanhas
eleitorais é porque "ninguém faz lei pra ser penalizado". Conforme o
pesquisador, uma saída interessante para o problema seria estabelecer um
teto sobre os gastos por partido e permitir que apenas pessoas físicas
façam doações, também estabelecendo um limite de valores. "As siglas
poderiam fazer campanhas de arrecadação em cima de bandeiras, esse seria
o melhor modelo. Por exemplo, fazer campanha focando em propostas, e aí
a pessoa contribui. Isso ajudaria já a politizar mesmo em uma campanha
de finança", sugere.
Em relação ao receio da sociedade sobre o
uso de recursos públicos, Uribam lembra que, na prática, já é feito esse
tipo de investimento, mesmo além do Fundo Partidário. "A demanda para
os deputados e já se configura indiretamente financiamento público de
campanha. O parlamentar ter um gabinete em Brasília é justo, mas aqui em
Fortaleza é campanha. Pagar gasolina para deslocamento às bases já é
campanha, embora diga que ele vá la também prestar contas do está
fazendo, ele vai também articular os cabos eleitorais, os militantes. A
questão do financiamento público é ter clareza também o que o partido
tem que ter para receber recursos, senão acaba desmoralizando a medida".
Investimento55
reais é o valor aproximado que os candidatos a prefeito nos dez maiores
colégios eleitorais do Estado pretendem gastar por eleitor na eleição
deste ano
95 reais é a quantia que os postulantes a prefeito nos
dez menores colégios eleitorais cearenses estimam gastar por eleitor
durante a campanha
BEATRIZ JUCÁREPÓRTER