quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

Mortes na Região Metropolitana aumentam quase 80% em 2020

 


O acirramento entre facções criminosas devido à disputa de território para o tráfico de drogas se estende e vem fazendo com que cidades localizadas no entorno da capital cearense sejam cenários para atos cada vez mais violentos. De janeiro a novembro de 2020, a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) contabilizou aumento de 79,6% nos Crimes Violentos Letais e Intencionais (CVLIs) na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), quando comparado com igual período do ano passado. São mais assassinatos ocorridos na RMF do que na própria Capital.

Os CVLIs englobam homicídio doloso, feminicídio, lesão corporal seguida de morte e roubo seguido de morte (latrocínio). De janeiro a novembro deste ano, foram registrados 1.150 crimes com alguma dessas tipificações nos 18 municípios distribuídos em três Áreas Integradas de Segurança (AIS) que totalizam a Região Metropolitana. Nos 11 primeiros meses de 2019, 640 pessoas foram assassinadas na RMF.

Já em Fortaleza, de acordo com a SSPDS, foram 1.141 até 30 de novembro de 2020, contra 638 em igual período do ano anterior. Atualmente, a Capital é composta por 10 AIS, sendo a Área nove a mais violenta, com 191 ocorrências.

Cidades

A cidade de Caucaia está na AIS 11. A Área é a mais violenta na Grande Fortaleza. De cidade pacata próximo à Capital até se tornar um dos centros mais disputados pelos traficantes. Diariamente, o município consta nas manchetes. Os crimes cada vez mais cruéis repercutem e causam temor naqueles que habitam a cidade há décadas.

Eduardo Silva (nome fictício), mora em Caucaia há quase 50 anos. De perto, o morador vem percebendo a violência tomar conta da rotina da população deste município. Há dois anos, o primo de Eduardo foi assassinado na cidade. O jovem de 15 anos de idade era suspeito de ter envolvimento com o tráfico de drogas. Há duas semanas, um novo luto. Um comerciante amigo de Eduardo morreu alvejado a tiros enquanto estava na calçada de um bar.

"A violência no nosso município aumentou bastante devido às facções. Moro em um bairro tranquilo, mas no entorno é tudo tomado de facções. Tem muito policiamento, mas não dá conta. Sinto que a Polícia Militar faz a parte dela, mas é preciso prender os grandes", diz o morador se referindo às prisões dos líderes das organizações criminosas.

O homem destaca ainda que as pichações feitas nos muros dão ordens diretas e mostram quem manda na região: "Eu ando nos bairros, rodo todo dia na Caucaia e vejo o medo das pessoas. Todos os bairros têm pichações com siglas de facções. Entro em uma rua e tem mandando tirar o capacete. O capacete é um item obrigatório que nós motociclistas precisamos usar, mas nos vemos obrigados a retirar por ordem dos criminosos, porque são eles quem mandam. A população fica no fogo cruzado", disse.

Em julho deste ano, a SSPDS divulgou uma importante prisão de um líder do tráfico em Caucaia. Francisco Cilas de Moura Araújo, conhecido como o 'Mago' foi detido durante uma operação interestadual, em um apartamento de classe média/alta em Teresina, Piauí. O suspeito estava na lista dos criminosos mais procurados pelas Polícias Militar e Civil do Ceará. Cilas era considerado líder do Comando Vermelho (CV) em Caucaia e estava foragido desde 2016.

Maranguape é outro município da RMF com mortes violentas que impressionam devido à crueldade. No dia 1º de julho, dois irmãos foram assassinados e a mãe deles ferida durante ataque de criminosos. Policiais que atenderam a ocorrência afirmaram que nenhum dos três era o verdadeiro alvo dos atiradores.

Outubro foi outro período marcado pela violência na Cidade. Em menos de 24 horas, um jovem foi assassinado em uma parada de ônibus, na frente da namorada e a outra vítima alvejada a tiros enquanto voltava para casa. Não há informações sobre possíveis ligações entre ambas execuções. Os casos seguem sendo investigados pela Polícia Civil.

Dinâmica do crime

O sociólogo e pesquisador do Laboratório de Estudos da Violência (LEV) da Universidade Federal do Ceará (UFC), Luiz Fábio Paiva, explica que o crime feito por grupos, como as facções, tem uma dinâmica intensa em termos de movimentação. Segundo o estudioso, a movimentação para regiões metropolitanas em todo o País é algo comum no comportamento das facções.

"Em geral são territórios com uma menor pressão do estado, sofrem ainda mais com a desestruturação, por serem espaços urbanos empobrecidos e com grande população que não têm acesso à Justiça, com serviços policiais precários. Essas áreas são preferenciais aos grupos se organizarem e desenvolverem ações que correspondem aos seus interesses. É uma movimentação bastante conhecida, mas que acaba sendo bem sucedida porque o poder público trabalha de uma maneira estática, que não consegue acompanhar. Vamos vendo a reprodução dos mesmos problemas que ocorrem naquelas áreas. A medida que vão ocupando novos espaços, levam para esses espaços os mesmo problemas sociais que nós já conhecemos: conflito armado é um deles. São grupos que disputam os territórios com violência e ao se consolidar nesses territórios impõem um determinado tipo de comportamento", disse Paiva.

Por nota, a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social se pronunciou informando focar nas ações de territorialização nas regiões onde são registrados os maiores índices de CVLIs. Disse ainda que fortalece a Polícia Civil com intuito de coibir a atuação e a disputa entre organizações criminosas.

"As ações de investigação da Polícia Civil ganharam reforço na RMF com a instalação de Núcleos de Homicídios e Proteção à Pessoa (NHPP) nas Delegacias Metropolitanas de Caucaia e de Maracanaú. Os dois municípios também receberam recentemente bases e policiais militares do Programa de Proteção Territorial e Gestão de Riscos (Proteger), que mantém policiamento fixo nas comunidades", conforme trecho da nota.

Ainda de acordo com a SSPDS, atualmente, o Programa de Proteção Territorial e Gestão de Riscos (Proteger) disponibiliza policiamento 24 horas em pontos estratégicos na Capital e em municípios da Região Metropolitana de Fortaleza. "Além da instalação dessas estruturas fixas da PMCE, o Proteger realiza o mapeamento de 70 indicadores como renda, saneamento e educação, referentes às áreas críticas de Fortaleza.

Com a integração entre diversos atores municipais e estaduais, Polícia e demais instituições da sociedade civil, as ações ocorrem no intuito de melhorar a situação dos microterritórios", se posicionou a Pasta.

De janeiro a novembro de 2020, mais mortes violentas foram registradas na Região Metropolitana de Fortaleza do que na Capital. Especialista aponta para o deslocamento de lideranças das facções criminosas

 dn

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