Tanto a reforma da Previdência, instituída pela PEC 6/2019, quanto a Medida Provisória 871/2019,
que muda regras para concessão de benefícios do INSS, impactam
negativamente a vida do trabalhador rural. Essa é a conclusão de
representantes do setor que participaram de audiência pública da
Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), nesta
segunda-feira (11). Desta vez, o ciclo de debates teve foco na
Previdência rural, atendendo requerimento do presidente da comissão, o
senador Paulo Paim (PT-RS).
Pela lei atual, os homens se aposentam com 60 anos e as mulheres, com
55. Com a reforma, todos passarão a se aposentar com 60 anos. Na
avaliação do assessor jurídico para assuntos previdenciários da
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Evandro
José Morello, caso o texto seja aprovado como está, 70% das produtoras
rurais atualmente ocupadas terão que trabalhar entre 41 e 46 anos para
alcançar a idade de aposentadoria, enquanto a expectativa média de vida
em muitos municípios não supera os 65 anos.
— Além de muitas começarem a trabalhar ainda antes dos 14 anos de
idade, precisamos levar em conta as condições de trabalho da mulher no
campo: é uma atividade penosa, insalubre, intensa, que leva de 12 a 14
horas de jornada.
Considerados segurados especiais no sistema de aposentadoria rural,
os trabalhadores rurais terão que contribuir anualmente com R$ 600 por
pelo menos 20 anos para se aposentar. Evandro ressalta, no entanto, que a
atividade agropecuária é de alto risco, sendo comum a perda da produção
devido a fatores como condições climáticas e ataques de pragas. Segundo
o especialista, também é comum o agricultor vender sua produção por um
preço que não cobre os custos.
— Tudo isso precisa ser observado. Ao tempo em que se afirma haver
uma Previdência rural deficitária, o sistema de arrecadação se mostra
ineficiente, e isso é algo que esperamos seja corrigido durante toda
essa discussão aqui no Congresso.
Economia
A coordenadora da Federação Nacional dos Trabalhadores e
Trabalhadoras na Agricultura Familiar (Fetraf) no Rio Grande do Sul,
Cleonice Back, disse que as trabalhadoras rurais estão preocupadas com a
reforma. Ela apontou que a maioria das propriedades rurais ainda é
administrada por homens e, por esse motivo, a autonomia financeira de
muitas mulheres só acontece com a aposentadoria.
— Essa é outra preocupação nossa, porque o sonho dessas mulheres será ainda mais adiado, caso essa medida seja aprovada.
Ao se posicionar contrariamente à reforma, Cleonice ponderou que as
mudanças propostas pelo governo são “uma tentativa de acabar com a
aposentadoria rural”.
— Pelo menos 60% dos agricultores do nosso país não terão condições
de contribuir e acabarão sendo excluídos da Previdência e da seguridade
especial. Além disso, alterar a idade para a aposentadoria das mulheres
deixa claro que esse governo não tem noção do que é o dia a dia de uma
mulher agricultora.
Cleonice Back ressaltou ainda que, em muitos períodos do ano, os
agricultores trabalham com saldo negativo e só não desistem da produção
porque não têm alternativas econômicas. Para ela, a reforma não pode ser
aprovada como está, porque “o trabalhador rural é digno de continuar se
aposentando aos 55 anos”.
— Além disso, o que vai ser dos pequenos municípios do nosso país? A
economia se movimenta nessas cidades em dias de pagamento da Previdência
Social, quando o trabalhador recebe seu benefício e se dirige ao
supermercado, à farmácia, e nós não podemos nos esquecer disso.
Mundo do trabalho
Diretor da Associação
Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, Paulo da Cunha Boal
disse que a reforma da Previdência desconsidera a realidade social do
país, especialmente no que se refere à vida do trabalhador do campo.
Para ele, os critérios propostos são “destoantes do dia a dia dessas
pessoas”, já que se trata de profissionais liberais, sem renda fixa
mensurável e ainda maltratados pelas más condições do trabalho.
— Todas essas características específicas foram desconsideradas no
texto. O engessamento da legislação que se propõe em relação às
mulheres, por exemplo, terá um reflexo absurdo daqui a alguns anos. Nós
teremos gerações e gerações de pessoas impedidas de se aposentar ou com
grandes dificuldades de manutenção de seu núcleo familiar.
Ao afirmar que os parlamentares precisam estar atentos às alterações,
Paulo Boal considerou que “a reforma da Previdência não dá tratamento
igualitário a todos”. Para ele, o texto, se for aprovado como está,
poderá aumentar as diferenciações que já existem entre os pobres, os
muito pobres e os muito ricos da nossa nação.
— É preciso, em vez disso, que se dê uma revitalização à Previdência
Social para evitarmos o aprofundamento do fosso social atual.
Paulo Paim defendeu que o debate sobre a reforma deve ser feito
repetidamente, em todas as esferas públicas do país, no intuito de
aumentar a conscientização sobre a seriedade do assunto.
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