O Senado aprovou na noite desta quarta-feira (26)
o projeto de lei que pune abuso de autoridade praticado por magistrados
e integrantes do Ministério Público. Por ter sido modificada,
a proposta volta à Câmara dos Deputados. Os três senadores cearenses
votaram. Tasso Jereissati (PSDB) e Cid Gomes (PDT) votam sim ao texto,
enquanto Luís Eduardo Girão (Podemos) votou não.
O texto, parado desde 2017, quando saiu da Câmara, ganhou celeridade
no momento em que a conduta do ministro Sergio Moro (Justiça), quando
juiz federal, está sob questionamento por causa da revelação de
mensagens trocadas entre ele e Deltan Dallagnol, procurador da Lava Jato
em Curitiba.
"Há uma verdadeira onda neste país com as notícias do Intercept [site
que começou a revelar os diálogos], com a tentativa de colocar sob
suspeição o ministro Sergio Moro. Há toda uma orquestração neste país,
como uma espécie de vingança contra aqueles que mudaram o país, contra
aqueles que construíram um país melhor", disse o senador Oriovisto
Guimarães (PODE-PR).
"Prefiro considerar que é sempre o momento que sejam para o bem da
sociedade e considero um avanço muito positivo tanto o combate à
corrupção quanto a previsão de abuso de autoridade de maneira muito
equilibrada. Não houve casuísmo quanto a estes acontecimentos de Sergio
Moro, Deltan Dallagnol e Lava Jato", afirmou o senador Rodrigo Pacheco
(DEM-MG), relator da matéria no Senado, que lembrou que a lei, se
aprovada também na Câmara, não pode retroagir e não que juiz orientar
uma parte no processo não está na lista de atividades que representam
abuso de autoridade.
Diante da pressão de representantes de juízes e procuradores, a
proposta foi suavizada pelo relator para ser aprovada na CCJ (Comissão
de Constituição e Justiça), no início da tarde, e no plenário, horas
depois.
O relator fez alterações em seu parecer até pouco antes da votação.
Foram apresentadas quase 50 emendas propondo mudanças. Ele acatou mais
de 30 delas nas últimas horas.
Senadores se esforçaram para mostrar que o projeto trata de medidas
de combate à corrupção, e não de abuso de autoridade, embora aborde o
assunto. A proposta de iniciativa popular chegou à Câmara sob o título
de 10 medidas de combate à corrupção, mas foi bastante modificada
durante a tramitação.
Diversos parlamentares se manifestaram pela retirada dos artigos que
elencam situações em que magistrados, promotores e procuradores estariam
abusando de sua autoridade. Disseram tratar-se de mordaça e protestaram
pelo projeto não alcançar outras autoridades.
"Há mais de dois anos, mais de 2 milhões de brasileiros subscreveram
proposta de integrantes do Ministério Público na esteira desta rica
experiência que ofereceu a Operação Lava Jato. Eram 10 medidas de
combate à corrupção. Foram mutiladas na Câmara, chegaram ao Senado como
verdadeiro Frankenstein e foram sepultadas. Hoje, assistimos esta
ressurreição", disse o líder do Podemos, senador Alvaro Dias (PR).
"Não há prioridade, nesta hora, para discussão do projeto de abuso de
autoridade. A prioridade para o povo brasileiro é a Operação Lava Jato.
Portanto, trata-se de uma trombada na aspiração popular de ver o Brasil
combatendo para valer a corrupção. Não há como negar que há, nesta
proposta, um limitador da ação de investigadores e julgadores. Não há
como não afirmar tratar-se de mordaça", afirmou Dias, que ressaltou
ainda que os políticos continuam com seus privilégios blindados.
No plenário, assim como na CCJ, o texto base, sem os artigos que
tratam do abuso de autoridade, foi aprovado em votação nominal. À noite,
foram 48 votos a favor e 24 contra. Como não é possível fazer uma
segunda votação nominal em menos de uma hora, os trechos sobre abuso
foram aprovados simbolicamente.
O relator Pacheco rechaçou a criminalização da interpretação de
juízes, o chamado crime de hermenêutica, e passou a exigir a existência
de dolo específico, ou seja, é preciso que haja vontade de praticar o
abuso de autoridade.
O relator rejeitou uma emenda que propunha a suspensão do trecho
segundo o qual constitui crime de abuso de autoridade dos magistrados e
integrantes do Ministério Público dar entrevistas sobre processos em
andamento. Mas acolheu outra emenda que suaviza a regra para promotores e
procuradores.
Para magistrados, é crime de abuso de autoridade "expressar, por
qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de
julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos,
votos ou sentenças de órgãos judiciais".
Estão ressalvadas, segundo o texto, a crítica nos autos e em outras técnicas ou no exercício do magistério.
Para promotores e procuradores, só é crime "expressar, por qualquer
meio de comunicação, juízo de valor indevido sobre procedimento ou
processo pendente de atuação do Ministério Público ou sobre
manifestações funcionais extrapolando o dever de informação e
publicidade". Foram mantidas as ressalvas feitas para magistrados.
"Sendo o Ministério Público parte no processo penal, é o órgão acusador, portanto parcial, ele poderia externar [posição] desta forma", justificou Pacheco.
"Sendo o Ministério Público parte no processo penal, é o órgão acusador, portanto parcial, ele poderia externar [posição] desta forma", justificou Pacheco.
Por outra emenda acatada, não caracterizará crime de abuso de
autoridade a investigação preliminar pelo Ministério Público sobre
notícia de fato, ou seja, não há crime na apuração preliminar realizada
por promotores e procuradores. A ressalva foi feita porque o texto diz
que comete crime o integrante do Ministério Público que promover
instauração de procedimento, civil ou administrativo, em desfavor de
alguém, sem que existam indícios mínimos da prática de algum delito.
Pacheco abrandou a pena para quem cometer abuso de autoridade. Se
antes a previsão era de reclusão, quando a pena já começa em regime
fechado, agora é de detenção, podendo começar em regime aberto ou
semiaberto. Segundo o relator, a restrição da liberdade estipulada
nesses dispositivos é de 6 meses a 2 anos, não havendo razão para se
prever o cumprimento de pena inicialmente em regime fechado.
Outra alteração foi realizada na legislação que disciplina a ação
civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente,
ao consumidor e a bens e direitos de valor artístico, estético,
histórico, turístico e paisagístico: quando proposta por "comprovada
má-fé", haverá condenação da associação autora ou membro do Ministério
Público, que terá que pagar as despesas processuais. Também foi acatado
um pedido para que atuação de juízes e promotores com motivação
político-partidária será crime apenas quando for evidente.
Segundo o projeto, qualquer pessoa poderá denunciar um magistrado se
identificar abuso de autoridade. Se o cidadão não possuir documentação
para comprovar o crime, precisará indicar o local onde as provas poderão
ser encontradas. Como a pessoa lesada por ato abusivo poderá oferecer
queixa, Pacheco suprimiu a possibilidade de a OAB (Ordem dos Advogados
do Brasil) e organizações da sociedade civil oferecerem queixa
subsidiária.
Combate à corrupção
A repressão ao abuso de autoridade é apenas um dos pontos projeto que, originalmente, trata de medidas de combate à corrupção.
O texto também prevê aumento da pena mínima para os crimes contra a
administração de dois para quatro anos de prisão, incluindo corrupção e
peculato.
Além disso, torna crime hediondo aquele cometido contra a
administração quando envolver valor superior a 10 mil salários mínimos e
cria dois crimes no Código Eleitoral, referentes a compra de votos e
caixa dois em campanha.
No caso de caixa 2, a pena será reclusão de dois a cinco anos. Caso a
fonte do dinheiro seja ilegal, proveniente de crime, as penas podem ser
aumentadas de um a dois terços. Quem fornecer ou doar os recursos
também está sujeito a punição.
Pacheco estabeleceu a perda de bens oriundos de atividade ilícita,
ainda que isso tenha ocorrido no exterior. Por outro lado, rejeitou uma
alteração promovida pela Câmara que ampliava de um para dois anos de
reclusão a pena mínima e de cinco para oito anos de reclusão a pena
máxima para estelionato –o famoso artigo 171 do Código Penal.
O crime de estelionato compreende obter, para si ou para outra
pessoa, vantagem ilícita, em prejuízo de alguém, induzindo ou mantendo
alguém em erro.
O QUE É ABUSO DE AUTORIDADE, SEGUNDO O SENADO
Para magistrados
- proferir julgamento, quando, por lei, seja impedido
- atuar, no exercício de sua jurisdição, com evidente motivação político-partidária
- exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou função, salvo de magistério
- exercer atividade empresarial ou participar de sociedade empresária, inclusive de economia mista, exceto como acionista ou quotista
- exercer cargo de direção ou técnico de sociedade simples, associação ou fundação, de qualquer natureza ou finalidade, salvo de associação de classe e sem remuneração
- receber, a qualquer título ou pretexto, custas ou participação em processo
- expressar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério
- proferir julgamento, quando, por lei, seja impedido
- atuar, no exercício de sua jurisdição, com evidente motivação político-partidária
- exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou função, salvo de magistério
- exercer atividade empresarial ou participar de sociedade empresária, inclusive de economia mista, exceto como acionista ou quotista
- exercer cargo de direção ou técnico de sociedade simples, associação ou fundação, de qualquer natureza ou finalidade, salvo de associação de classe e sem remuneração
- receber, a qualquer título ou pretexto, custas ou participação em processo
- expressar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério
Para membros do Ministério Público
- emitir parecer, quando, por lei, seja impedido
- recusar-se à prática de ato que lhe incumba
- promover a instauração de procedimento, civil ou administrativo, em desfavor de alguém, sem que existam indícios mínimos de prática de algum delito
- receber, a qualquer título e sob qualquer pretexto, honorários, percentagens ou custas processuais
- exercer a advocacia
- participar de sociedade empresária na forma vedada pela lei
- exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função pública, salvo de magistério
- atuar, no exercício de sua atribuição, com evidente motivação político-partidária
- receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei
- expressar, por qualquer meio de comunicação, juízo de valor indevido sobre procedimento ou processo, pendente de atuação do Ministério Público, ou sobre manifestações funcionais, extrapolando dever de informação e publicidade, em juízo ou fora dele, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério
- emitir parecer, quando, por lei, seja impedido
- recusar-se à prática de ato que lhe incumba
- promover a instauração de procedimento, civil ou administrativo, em desfavor de alguém, sem que existam indícios mínimos de prática de algum delito
- receber, a qualquer título e sob qualquer pretexto, honorários, percentagens ou custas processuais
- exercer a advocacia
- participar de sociedade empresária na forma vedada pela lei
- exercer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função pública, salvo de magistério
- atuar, no exercício de sua atribuição, com evidente motivação político-partidária
- receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei
- expressar, por qualquer meio de comunicação, juízo de valor indevido sobre procedimento ou processo, pendente de atuação do Ministério Público, ou sobre manifestações funcionais, extrapolando dever de informação e publicidade, em juízo ou fora dele, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério
Punição para magistrados e membros do Ministério Público
- detenção de 6 meses a 2 anos, e multa
- detenção de 6 meses a 2 anos, e multa
dn
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