Em clima de desgaste diante da opinião pública, o
presidente Jair Bolsonaro (PSL) terá oportunidade de contra-atacar
notícias negativas ao Governo em visita inédita ao Nordeste. A viagem,
marcada para a próxima sexta-feira (24) ao Estado de Pernambuco, é uma
vitrine de agendas. A começar pela reforma da Previdência, que encontra
ampla resistência de nordestinos no Congresso.
O presidente, conforme cientistas políticos entrevistados pelo Diário
do Nordeste, terá, ainda, pela primeira vez, a chance de comandar a
articulação política do Governo, até então desencontrada por aliados.
Quase seis meses depois de assumir a Presidência da República, o militar
reformado aponta, agora, para a região como um novo caminho para o
Governo.
Em Petrolina, cidade pernambucana, o presidente vai entregar um
conjunto habitacional do programa Minha Casa Minha Vida. Já na Capital
do Estado, Recife, ele deverá anunciar um acréscimo de R$ 2,1 bilhões ao
Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste, a ser usado em obras
de infraestrutura. É aguardada uma reunião com os governadores da
região no mesmo dia.
Na pauta, agendas de interesse dos Estados, como o controle e a
atuação de órgãos regionais, a exemplo do Banco do Nordeste do Brasil
(BNB), da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), do
Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), entre outros.
Congresso
Antes da viagem a Pernambuco, o presidente tem encontro em Brasília,
nesta quarta-feira (22), com parlamentares da bancada do Nordeste no
Congresso Nacional. O coordenador da bancada cearense, deputado federal
Domingos Neto (PSD), lista prioridades a serem levadas para a reunião.
"Recursos para obras estruturantes no Nordeste, medidas que protegem a
região, como a prorrogação do Fundeb (Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da
Educação), a manutenção do BNB (Banco do Nordeste), além de aumentar 1%
do FPM (Fundo de Participação dos Municípios) do mês de setembro",
cita.
A nomeação, a ser confirmada, do sanfoneiro e empresário pernambucano
Gilson Machado Neto para a Embratur também é vista como aceno de
Bolsonaro à região.
Cleyton Monte, cientista político e pesquisador do Laboratório de
Estudos sobre Política, Eleições e Mídia, da Universidade Federal do
Ceará (UFC), situa o desafio do presidente nos próximos dias em meio às
dificuldades do Governo em Brasília. "É uma região onde residem os
principais opositores do presidente. Uma coisa é eleição, outra coisa é
administração. Desde que tomou posse, o presidente, nos seus discursos e
nas mensagens virtuais, não acenou proximidade com o Nordeste, não
estabeleceu pontes com a região, e isso acabou acarretando no
distanciamento dos governadores", analisa.
Monte lembra ainda que, desde a redemocratização, nenhum presidente
brasileiro conseguiu aprovar agendas estruturantes sem os votos do
Nordeste. Negociar com governadores hostis à agenda do Palácio do
Planalto, portanto, é um teste para o chefe do Executivo. "O presidente
tem que ser o grande articulador do Governo. A partir do momento em que
ele abre mão dessa possibilidade, está abrindo mão do futuro político do
Governo dele", explica.
Cientista político da Universidade de Fortaleza (Unifor), o professor
Francisco Moreira Ribeiro considera a viagem de Bolsonaro e o encontro
com os governadores um passo importante para a governabilidade e
aprovação das pautas prioritárias da gestão.
Diálogo
"Ele tem dificuldades imensas e acho que aqui ele vai encontrar isso.
Agora, se ele quer negociar, vai ter que negociar com os que são
críticos. Não se faz política sozinho. A oposição sempre fez parte do
processo, e ela é fundamental. Se ele vem para encontrar só com os dele,
não precisa vir. Se vem com o objetivo de ampliar a base e ter o apoio
desses governadores é um passo significativo", considera.
Ribeiro lembra, inclusive, que a viagem ao Nordeste acontecerá dias
depois da maior manifestação contra o Governo Federal nesses primeiros
meses de gestão e de desencontros da própria base aliada. "Ele está num
processo de desgaste, perde credibilidade a olhos vistos, então, tem que
fazer algum tipo de movimento no sentido de reconquistar atores
importantes da vida política nacional para o seu projeto", diz.
Há expectativa de visita do presidente aos demais Estados da região.
No entanto, ainda não foi divulgada previsão de datas das próximas
viagens. Para os cientistas políticos, o distanciamento do presidente em
relação à região lembra de forma recente as eleições de 2018. A agenda,
por outro lado, também antecede manifestações de apoio a Bolsonaro que
estão sendo marcadas para o próximo domingo (26), inclusive no Nordeste.
Presidente começa por bancada do Nordeste
As investidas do presidente Jair Bolsonaro ao Nordeste começam
amanhã, quando ele se reúne com a bancada de parlamentares federais
eleitos da região. Ainda não se sabe quais pautas serão levantadas pelo
chefe do Executivo Federal, mas a lista de demandas que dependem de
apoio da União para serem destravadas é extensa, como adiantou ao Diário
do Nordeste o coordenador da bancada cearense, o deputado federal
Domingos Neto (PSD).
Além do direcionamento de órgãos federais com sede na região, também
estão entre as prioridades o novo Fundeb e o FPM. Pleitos de interesse
do Nordeste já foram discutidos entre o governador Camilo Santana (PT) e
a bancada. No campo de oposição ao Governo Bolsonaro, o chefe do
Executivo estadual tem usado de todas as frentes, principalmente por
meio da bancada federal, para estabelecer um canal de diálogo com o
Palácio do Planalto.
Em fevereiro deste ano, Camilo apresentou uma série de pautas
prioritárias do Ceará com o Executivo, o Legislativo e o Judiciário.
Entre elas, a aprovação do Projeto de Lei Complementar (PLP) que
regulamenta a securitização da dívida ativa da União, dos estados e dos
municípios, além da repartição de recursos pela cessão onerosa dos
campos de petróleo. (Letícia Lima)
DN
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